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sexta-feira, 19 de março de 2010

Trabalho infantil artístico

Introdução

Esse tema (trabalho infantil artístico) sempre causou perplexidade, mesmo nos estudiosos do direito.
Realmente é interessante observar, de um lado, a clara vedação constitucional de trabalho para o menor de 16 anos de idade (artigo 7º, XXXIII, CF/88), e, de outro lado, a realidade do trabalho infantil (escancarada nos programas de televisão).
Já vi muitas manifestações (alunos, freqüentadores de fóruns de debate) afirmando que a Constituição é claríssima no sentido de vedar o trabalho do menor de 16 anos de idade, e que esse trabalho com crianças na televisão se dá em virtude da força da Rede Globo e que as instituições públicas (como o Ministério Público do Trabalho) se curvam diante dos detentores do poder. Já vi, de outra parte, professores afirmando que o que ocorre é um trabalho cultural, encampado por uma aceitação social (acho o argumento inconsistente para fazer confronto com o texto constitucional).

Vamos então, com este pequeno texto, apresentar uma fundamentação justificadora do labor infantil artístico.

LEGISLAÇÃO

Inicialmente apresento a legislação necessária para o trato com a matéria: Convenção 138 – incorporada ao direito brasileiro através do decreto 4.134/2002, artigos 5º, IX, 7º, XXXIII, 114, 227, da Constituição Federal de 1988.
DA CONVENÇÃO 138.

O ideal seria que, ao analisar essa convenção, trouxéssemos ao debate a questão da posição hierárquica ocupada no cenário jurídico atual. Teríamos que enfrentar então as teorias existentes no sentido de ser a convenção recepcionada no Brasil com força de lei ordinária, com força de supralegalidade, com força constitucional ou em patamar de supraconstitucionalidade. Mas vou deixar a análise prá outra oportunidade (embora seja muito recomendável um estudo em apartado sobre esse tema tão atual). Considerarei que as convenções sobre direitos humanos possuem aqui força constitucional.
Por enquanto, para o nosso estudo aqui, vamos compreender que a convenção tem hierarquia constitucional e que deva ser cumprida tal como recebida em atendimento ao princípio “pacta sunt servanda”.
A Convenção 138 estabeleceu vedação de trabalho infantil a menores de 15 anos. Essa é uma vedação genérica. Nossa Constituição de 1988, firmou a vedação genérica de qualquer trabalho infantil em 16 anos de idade. O texto a ser atendido, ao qual nos submetemos, é o texto constitucional, visto que a Convenção fez apenas uma “sugestão” e o Brasil deu uma proteção ainda maior (e o objetivo da convenção é mesmo de proteção, ou seja, o objetivo é que não se trabalhe muito cedo para se evitar uma série de problemas do desenvolvimento).
Essa Convenção 138 (artigo 2º, 1) possibilitou que o Estado que a ratificasse poderia encaminhar comunicação referente a atividades em que seria permitido o trabalho infantil (como exceção). Ocorre que o Brasil não se serviu dessa faculdade.
Em que pese a vedação genérica fixada, a Convenção possibilitou o trabalho infantil artístico, desde que não prejudicial à criança e desde que autorizado por autoridade competente (entendemos que a autoridade competente, no Brasil, seja o Juiz do Trabalho).
Veja, então, que a Convenção que trata do trabalho infantil tem uma vedação genérica e duas exceções a permitir o trabalho infantil em dadas circunstâncias.

DO TEXTO CONSTITUCIONAL

A vedação constante no artigo 7º, XXXIII, da CF/88 deve ser entendida como uma vedação genérica (nos moldes do que observado na convenção 138, acima).
Vamos ver o teor do artigo 7º, XXXIII, CF/88:
"Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menor de 18 (dezoito) e de qualquer trabalho a menores de 16 (dezesseis) anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 (quatorze) anos".
O contraponto a este artigo é o artigo 5º, IX, da Constituição Federal de 1988, que assim dispõe:
"É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de sensura ou licença".
Desses dispositivos constitucionais podemos extrair que o artigo 7º da CF/88 pretendeu proteger a criança para que esta não seja objeto de exploração e possa se desenvolver sem pular etapas da vida.
Já o artigo 5º, IX, da CF/88, nos faz transparecer a idéia de que há dons que devem ser desenvolvidos imediatamente, sem sensura ou licença, aqui incluída a situação da criança. Mas sempre estabelecendo-se uma ligação entre os dois dispositivos constitucionais para que não haja exploração do trabalho infantil.

Conclusão.

Assim, nos moldes do que já elencado na convenção 138, e com fincas no artigo 114 da CF/88 (relação de trabalho), é possível que a autoridade competente autorize o trabalho infantil artístico, cuidando para que este trabalho não prive a criança de sua necessidade de estudar, brincar, enfim, de desenvolver-se nos seus aspectos relevantes e fundamentais, pois à criança são conferidas prioridade absoluta e proteção integral (artigo 227 da CF/88).

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